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domingo, 8 de setembro de 2013

A memória e o esquecimento

O narrador, introspectivo, mergulha um bolinho dentro de uma xícara de chá. Nesse momento, sente um aroma e um sabor que trazem as lembranças das manhãs de domingo de sua infância. "E toda minha vida passada saiu naquele momento, daquela xícara de chá", escreveu Marcel Proust em sua mais famosa obra, Em Busca do Tempo Perdido. 

A memória é assim mesmo: uma incrível biblioteca, com fileiras e fileiras de arquivos, que podem ser acessados imediatamente com base em um estímulo qualquer, como um som, um cheiro, um gosto, um toque. E nesses arquivos, formados por 100 bilhões de neurônios, sempre há espaço para novidades, como novas pessoas, ou até um número de telefone que somos capazes de lembrar - ou esquecer - num piscar de olhos. 

O problema é que nosso maravilhoso sistema de arquivos pode ficar "lotado" ou simplesmente desaparecer. "O aspecto mais notável da memória é o esquecimento", afirma James McGaugh, professor de neurobiologia da Universidade da Califórnia. Nós não guardamos a maior parte dos fatos que vivenciamos, dos livros que lemos, das imagens que vemos. Mesmo da nossa infância, quando fazemos mais descobertas, esquecemos quase todas as coisas. 

Até aí, normal. A formação e a evocação da memória mobilizam e ocupam muitas células, e é necessário liberar um espaço de vez em quando. Na verdade, é importante esquecer as coisas para que a cabeça não vire um depósito de lixo - ora inútil, ora traumático. Nada melhor do que se livrar de nossos sofrimentos. O problema é perder o controle do esquecimento. Esse fenômeno, conhecido como amnésia, é uma das questões mais intrigantes da medicina.
 

Na cabeça 


Para entender como a memória se apaga, é preciso lembrar antes como ela se forma. O processo é bastante complexo - trata-se de um fenômeno biológico e psicológico, que envolve uma aliança de diferentes sistemas cerebrais que funcionam em conjunto. 

Não se sabem ao certo todas as várias partes envolvidas, mas os indícios são de que ele seja coordenado pelo hipocampo - responsável pela formação das memórias - e pela amígdala - associada às memórias emocionais. Tudo é ativado por sinapses cerebrais, que liberam determinadas substâncias químicas (neurotransmissores), dependendo do tipo de memória que é evocado no momento. Existem 3 tipos básicos: memória ultrarrápida (retida por alguns segundos, como um número de telefone), a de curto prazo e a de longo prazo. 

A amnésia acontece quando esse sistema entra em pane - por exemplo, por doenças neurodegenerativas, como o mal de Alzheimer, infecções e derrames, pancadas na cabeça, traumas psicológicos, alcoolismo e uso de drogas. 




Isso é diferente de uma simples falha de memória, que ocorre o tempo todo devido à redução do número de sinapses cerebrais e de neurônios. Se essa redução acelerar, aí sim podemos falar em amnésia - que pode valer para informações novas (a amnésia anterógrada) ou para as antigas (amnésia retrógrada). 

Apesar de não existir um tratamento específico da amnésia, é possível recuperar pelo menos parte da memória, dependendo da extensão e da gravidade da lesão cerebral, com exercícios como a exposição dos pacientes a estímulos novos ou a fragmentos das memórias a serem evocadas, terapia ocupacional e, em alguns casos, medicamentos. 

"Pesquisadores estão investigando diversos neurotransmissores envolvidos na formação da memória, que pode um dia levar a novos tratamentos. Mas a complexidade dos processos cerebrais envolvidos torna improvável que um só medicamento resolva todos os problemas de memória", afirma Larry Squire, professor de psiquiatria da Universidade da Califórnia, em San Diego. 

Mas o mais difícil mesmo é recuperar a capacidade de guardar novas informações - a amnésia anterógrada. Para isso, especialistas sugerem que o melhor tratamento é a prevenção. E aí valem as medidas clássicas, como não fumar, não beber, praticar exercícios físicos, manter uma dieta equilibrada e, principalmente, botar a cabeça para funcionar. 

"O melhor exercício é a leitura porque abrange todas as formas de memória: a memória visual, verbal, motora, a memória de curta duração e de longa duração, a memória de imagens", afirma o neurocientista Ivan Izquierdo. "A pessoa lê ‘árvore’ e movimenta as cordas vocais de acordo com o som da palavra. Num instante, também, passam por sua cabeça todas as árvores que é capaz de lembrar. Lê ‘árvores secas’ e se lembra de um poema." Segundo Izquierdo, a memória é a expressão mais acabada de que a função faz o órgão. Ela funciona melhor quanto mais se utiliza. Tanto que até a doença de Alzheimer é menos grave nas pessoas com cultura elevada. Quanto mais sinapses, menor o prejuízo. 

Nossa memória está diretamente ligada à nossa história, ao que somos - daí a importância de cuidar bem dela. Para o pensador italiano Norberto Bobbio, "nós somos aquilo do que nos lembramos". Izquierdo acrescenta: "Somos também aquilo que escolhemos esquecer".



Os tipos de memória... 

Processual

 Armazena o modo de fazer as coisas - por exemplo, como dar laço no cadarço. 


Visual 



Registra imagens como rostos e lugares. Assim, você pode desenhar um elefante sem que ele esteja diante de você. 


Episódica 



Guarda acontecimentos da sua vida - desde o que você comeu de café da manhã até o seu primeiro beijo. 


Topo­cinética 



Grava a posição e o movimento do corpo no espaço. Graças a ela, você consegue caminhar automaticamente até a sua casa. 


Semântica 



Guarda palavras, raciocínios e o sentido das coisas.

...e de amnésia 

Síndrome de Korsakoff 



É um tipo grave de amnésia, decorrente do alcoolismo. Seu portador não consegue reter novos acontecimentos. 


Amnésia traumática 



Quem sofre trauma no crânio pode esquecer o que ocorreu logo antes e depois do acidente. Quanto maior for o trauma, mais prolongada será a amnésia. 


Amnésia global 



Não se retêm informações novas nem antigas. Ocorre em demências, traumas muito graves e intoxicações por monóxido de carbono. 


Amnésia global transitória 



Dura apenas algumas horas, e a recuperação é quase total. A causa não está ainda esclarecida. 


Amnésia psicogênica 



É temporária e ocorre devido a traumas psicológicos. Pode ser tanto anterógrada como retrógrada. Raramente há a perda permanente de trechos de sua vida.
Fonte: Super Interessante.


domingo, 30 de junho de 2013

Por que às vezes esquecemos o que íamos fazer no meio do caminho?

Você já entrou em uma sala e esqueceu o que ia fazer lá? Sim, você e todo mundo. Pelo menos agora a ciência explica o porquê: o problema é a entrada.




“Quando você passa de um local para outro, seu cérebro identifica cada um como um novo evento, e prepara a memória para capturá-lo”, afirma o autor do estudo e professor de psicologia da Universidade de Notre Dame, Gabriel Radvansky.

 Como os capítulos de um livro, cada entrada marca o fim de um episódio e o começo de outro, pelo menos para o seu cérebro. “Isso torna difícil reviver memórias anteriores porque elas já foram arquivadas”, afirma o autor.

Radvansky sugere levar um lembrete com você. “Por exemplo, se você vai da sala para a cozinha pegar um lanche, você talvez esqueça o que ia fazer quando chegar lá, já que é um novo evento. Mas, facilita se você levar algo que o lembre do que queria, como um pote”.
Mas quem deixa potes na sala?

Você pode fazer um pote com suas mãos quando estiver indo para a cozinha. Se você vai pegar uma tesoura, faça com os dedos. Assim você ajuda seu cérebro a não ser tão esquecido.

Fonte: Hypescience