A nomeação do deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP), acusado de homofobia e racismo, para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) causou polêmica, protestos e abaixo-assinado. A indignação faz sentido: o objetivo da CDHM, uma das 20 comissões permanentes da Câmara dos Deputados, é contribuir para a afirmação dos direitos humanos. Além de receber, avaliar e investigar denúncias de violações, a comissão tem o dever de discutir e votar propostas legislativas relativas ao tema. E algumas delas podem dar muito o que falar. Em sua primeira reunião à frente da comissão, Feliciano retirou de pauta algumas das propostas mais controversas. Para você ficar por dentro do que acontece dentro da Câmara (e acompanhar o que está por vir), listamos 8 propostas polêmicas que passam pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias:
Autor: Eduardo Cunha (PMDB/RJ)
Enquanto o Senado Federal discute o Projeto de Lei 122/2006, que propõe a criminalização da homofobia no país, está tramitando na Câmara dos Deputados um projeto que também procura acabar com a discriminação motivada pela orientação sexual. A diferença é que a proposta discutida na Câmara visa proteger heterossexuais vítimas do preconceito. O PL 7.382/10 penaliza a heterofobia e determina que medidas e políticas públicas antidiscriminatórias atentem para essa possibilidade. No texto do projeto, Eduardo Cunha (PMDB/RJ), autor da proposta, justifica que “maiorias também podem ser vítimas de discriminação – e que as políticas públicas antidiscriminatórias não podem simplesmente esquecê-las”.
Erika Kokay (PT-DF), relatora do PL, vê um problema aí: em seu parecer sobre a proposta, a deputada disse que a proteção às pessoas, de forma geral, já está contemplada na legislação vigente. “A proteção de minorias tem a ver com o próprio princípio democrático, em que as decisões são tomadas pelas maiorias, daí a necessidade de proteger aqueles que têm opiniões e orientações diferentes. (…) As agressões, assassinatos, humilhações e outras condutas discriminatórias que são praticadas contra homossexuais não são verificadas em relação aos heterossexuais em função de sua orientação sexual”, afirma. Kokay recomenda a rejeição do PL, que ainda aguarda deliberação na Comissão de Direitos Humanos e Minorias. O projeto seria discutido no primeiro encontro da comissão sob a direção do deputado Marcos Feliciano (PSC-SP), mas foi retirada de pauta pelo pastor.
Autor: Jean Wyllys (PSOL-RJ)
A realização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo no Brasil fez com que, em janeiro deste ano, voltasse a entrar em pauta o debate sobre a regulamentação da atividade dos profissionais do sexo, proposto no PL 4.211/2012. O texto, de autoria do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), considera profissional do sexo toda pessoa capaz e maior de 18 anos que recebe dinheiro por serviços sexuais prestados voluntariamente. O projeto determina que os profissionais poderão atuar de forma autônoma ou em cooperativa e terão direito a aposentadoria especial após 25 anos de serviço de acordo com a Lei de Benefícios da Previdência (8.213/91) – que garante aposentadoria antecipada para os segurados que desempenham trabalho que prejudique a saúde ou a integridade física.
Para evitar a polêmica, o deputado deixa claro: o objetivo do projeto não é estimular o crescimento do número de profissionais do sexo, mas sim tirar a profissão da marginalidade, garantindo aos profissionais acesso à saúde, ao direito do trabalho, à segurança pública e, principalmente, à dignidade humana. “Impor a marginalização do segmento da sociedade que lida com o comércio do sexo é permitir que a exploração sexual aconteça, pois atualmente não há distinção entre a prostituição e a exploração sexual”, afirma Jean Wyllys na justificativa do projeto. O projeto proíbe a exploração. Ou seja, apropriar-se de mais de 50% dos rendimentos da prostituição, violentar ou ameaçar uma pessoa para forçá-la a se prostituir, ou não pagar pelo serviço prestado vira crime.
O projeto aguarda designação de um relator na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), que deve elaborar um parecer sobre a proposta.
Autor: João Campos (PSDB-GO)
De um lado a regulamentação, do outro a criminalização. O PL 377/2011, de João Campos (PSDB-GO), tem como proposta acrescentar um artigo ao Decreto-Lei nº 2.848 do Código Penal que defina como crime a contratação de serviços sexuais. O PL prevê também incluir na mesma pena quem aceita a oferta de prestação de serviço de natureza sexual, sabendo que o serviço está sujeito à remuneração.
“Entendemos que a venda do corpo é algo não tolerado pela sociedade. A integridade sexual é bem indisponível da pessoa humana e, portanto, não pode ser objeto de contrato visando a remuneração”, defende o deputado. Na proposta, João Campos destaca que seria criminalizada apenas a conduta de quem paga ou oferece pagamento pelos serviços sexuais, e não a dos profissionais do sexo – e que, por isso, acredita que o PL não contribuiria para a estigmatização da profissão. O projeto aguarda parecer na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) e depois seguirá para a CDHM.
Autor: Washington Reis (PMDB-RJ)
O artigo 20 da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 define como crime, sem ressalvas, a prática, indução ou incitação da discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Isso pode mudar se for aprovado o PL 1.411/2011, que propõe a inclusão de um novo parágrafo ao artigo: segundo o novo texto, recusar celebrar casamentos ou proibir a permanência de pessoas que violem seus valores, doutrinas, crenças e liturgias em templos religiosos, não podem mais ser considerados crimes de discriminação.
Para justificar o projeto, Washington Reis (PMDB-RJ) se baseia no princípio de liberdade religiosa, protegida pela Lei. “Deve-se a devida atenção ao fato da prática homossexual ser descrita em muitas doutrinas religiosas como uma conduta em desacordo com suas crenças. Em razão disso, pelos fundamentos anteriormente expostos, deve-se assistir a tais organizações religiosas o direito de liberdade de manifestação”, afirma no texto. A relatora do PL, Luiza Erundina (PSB-SP) solicitou a realização de audiência pública para discutir o projeto, buscando verificar o impacto que a medida pode ter sobre a proteção e a promoção dos direitos humanos no Brasil.
Autor: Senado Federal
Seria discutido no primeiro encontro da comissão sob a direção do deputado Marco Feliciano (PSC-SP), nesta quarta-feira, o PL 6418/2005, de autoria do Senado Federal. O projeto, retirado de pauta pelo pastor, está em tramitação na Câmara desde 2005 e define os crimes resultantes de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.
O artigo 5.°, XLII, da Constituição Federal de 1988 define o racismo como um crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. Já a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, definiu os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Mas, para os legisladores, ainda falta muito. “O maior mérito do Projeto de Lei n.° 6.418, de 2005, está em seu artigo 2.°. Ele descreve de maneira mais precisa o crime de discriminação resultante de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem, fazendo com que sejam contempladas muitas condutas que, hoje, apesar da clara presença de motivação discriminatória, acabam sendo enquadradas em outros tipos penais”, afirmam as relatoras do PL, Janete Rocha Pietá (PT-SP) e Erika Kokay (PT-DF).
Autor: Maurício Rands (PT-PE)
O PL 6.297/2005, que atualmente aguarda parecer na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, propõe que seja acrescentado à Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social) um parágrafo que inclua, como dependente, o companheiro ou companheira homossexual que mantenham relacionamento estável com assegurados do INSS. A relatora do projeto, Jô Moraes (PCdoB-MG), conferiu parecer favorável à aprovação do PL em 2011. Em sua justificativa, a deputada toma precaução ao abordar um dos pontos mais polêmicos quando o assunto é a equiparação dos direitos dos casais homo e heterossexuais – a Constituição Federal considera que, para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar.
Mas isso mudou no dia 5 de maio do mesmo ano, quando o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável para casais do mesmo sexo. Desde então, companheiros em relação homoafetiva duradoura e pública têm os mesmos diretos e deveres das famílias formadas por homens e mulheres. Com a decisão, a aprovação do PL 6.297/2005 seria facilitada, mas ainda encontra oposição: o atual presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias,Marco Feliciano (PSC-SP), apresentou em duas ocasiões, no ano de 2011, voto em separado pela rejeição do projeto de lei.
“Não se observa do relacionamento homossexual uma característica inata merecedora de proteção estatal, haja vista que há apenas uma associação afetiva e eventualmente patrimonial voltada para a satisfação dos interesses e prazeres mútuos”, afirmou o pastor.Para ele, os casais héteros só têm direito á pensão por causa da “presumível contribuição na criação de novos integrantes produtivos para nação” – ou seja, a reprodução -, algo que considera impossível em relações homoafetivas. Mas o deputado não considera a adoção como argumento válido para a confirmação do direito à pensão. “Mesmo se essa hipótese fosse possível, há de se ter em mente que não se poderá presumir que a maioria ou até mesmo uma pequena parcela minimamente representativa dos relacionamentos homossexuais vão se prestar à criação de filhos”, afirma o deputado Marco Feliciano (PSC-SP) no mesmo texto.
7. Permissão da “cura gay” [PDC 234/2011]
Autor: João Campos (PSDB-GO)
Os artigos 3º e 4º da Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 1/99 de 23 de Março de 1999 estabelecem normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual. Psicólogos estão proibidos de exercer qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas ou oferecer qualquer tratamento relacionado à “cura” da homossexualidade. Mas o Projeto Decreto Legislativo 234, de 2011, quer mudar isso.
O autor da proposta, João Campos (PSDB-GO), acha que a decisão “extrapola o poder (do CFP) de legislar”, uma vez que a definição de regulamentações é função do Poder Legislativo. O projeto do deputado quer suspender a resolução que, segundo o deputado, “restringe o trabalho dos profissionais (de psicologia) e o direito da pessoa de receber orientação profissional”. Em outras palavras, ele quer defender o direito de um psicólogo de oferecer o tratamento milagroso da cura gay, se ele quiser. O projeto de Campos recebeu parecer favorável de Roberto de Lucena (PV-SP), relator da matéria na Comissão de Seguridade Social e Família, e aguarda agora designação de relator na Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Diferentemente de um Projeto de Lei, o Projeto de Decreto Legislativo não envolve participação da Presidência da República – se aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, o PDC poder ser promulgado pelo presidente do Senado.
Autor: André Zacharow (PMDB-PR)
Você é a favor ou contra a união civil de pessoas do mesmo sexo? A proposta do André Zacharow (PMDB-PR) é levar os eleitores brasileiros às urnas para responder a essa pergunta. Em justificativa do PDC 232/2011, o deputado defende que a tentativa de promover uma reforma constitucional sem consulta popular “será inútil e apenas acirrará ainda mais os ânimos divergentes”. Sendo convocado o plebiscito, todos os projetos de lei ainda não efetivados relacionados ao tema da consulta popular teriam tramitação interrompida – só depois do resultado, decidido pela maioria simples (ou seja, 50% dos votos mais 1), seriam tomadas decisões e mudanças na Constituição.
A relatora do PDC, Erika Kokay (PT-DF), destacou a importância da participação popular na tomada de decisões e nas leis, já que isso é um direito fundamental do ser humano e o define como cidadão. Mas deu parecer pela rejeição do projeto e discutiu a sua validade. “A democracia contemporânea não se resume (…) à prevalência da maioria nos processos decisórios públicos. Ela vem sendo construída, ao longo dos últimos séculos, como uma conjugação do princípio da maioria com a defesa dos direitos das minorias e, mais especificamente, com a delimitação de uma área de direitos inalienáveis que sequer a legislação estatal pode ferir”, afirma.
Retomando a decisão tomada pelo STF em 2011, que situou a união homoafetiva no âmbito das liberdades e garantias individuais, ela afirma que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias “só pode posicionar-se decididamente em defesa da igualdade fundamental entre pessoas de orientações sexuais distintas, uma das bases inafastáveis do Estado de direito que estamos construindo, cujo núcleo é a dignidade humana. Qualquer decisão diferente dessa seria legitimar a intolerância, o preconceito e a odiosa discriminação contra as pessoas em razão da orientação sexual adotada, o que poderia, inclusive, contribuir para estimular e acirrar ainda mais o sentimento de homofobia que, de forma tão clara e intensa, aflora e se manifesta cotidianamente em diversos segmentos de nossa sociedade”.
O PDC, que estava entre os temas a serem discutidos na reunião da CDHM desta quarta-feira, foi retirado de pauta pelo presidente da Comissão, o Pastor Marco Feliciano.
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